segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Doe-se de corpo e alma

Há algum tempo, a revista “Piauí” trouxe interessante reportagem sobre a grande demanda por cadáveres nas escolas de medicina e as dificuldades criadas pela legislação e pela cultura brasileira. O texto lembrava, entre outras coisas, que de acordo com a Sociedade Brasileira de Anatomia e bons professores, o ideal é que se tenha um cadáver inteiro – também chamado de “fresco” ou “novo”, isto é, não trabalhado por turmas anteriores – para cada grupo de seis alunos. É mole?
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Só no Estado de São Paulo, são 28 escolas médicas, cerca de 2.700 novos alunos a cada ano. Por essa conta, seriam necessários cerca de 500 corpos. Como no resto do país há outras 130 faculdades de medicina, com cerca de 12.200 alunos, o ensino médico nacional tem uma demanda anual de pelo menos 2.000 cadáveres. Richard Halti Cabral, 33 anos,então presidente da Sociedade Brasileira de Anatomia, disse que um cadáver para seis alunos já seria “muito bom”. “Mas o ideal, ideal, seria um cadáver para dois alunos, porque cada corpo tem duas pernas, dois braços, o que daria um membro para cada estudante.”
Se faltar, sempre pode aparecer um cadáver ou outro disposto a dar uma mãozinha.
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Conhecida como “Piscinão” pelas suas dimensões, a geladeira do serviço de dissecação da USP tem espaço para abrigar 50 corpos, enquanto o Instituto Médico Legal central de São Paulo, por exemplo, tem capacidade para apenas 36. Parodiando o pessoal do Casseta, pode-se dizer que brasileiro é assim: até na hora da exumação do cadáver quer tirar o corpo fora.
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A reportagem prossegue dizendo que o uso de cadáveres em estudo e a dificuldade em obtê-los remontam a períodos medievais, quando pesquisadores roubavam corpos de cemitérios. No Brasil, até os anos 60, os hospitais psiquiátricos eram os grandes fornecedores de corpos para pesquisa. Para Belo Horizonte iam os cadáveres do manicômio de Barbacena; para o Rio, os da Colônia Juliano Moreira, para São Paulo, os
do Juqueri. “Eram os campos de concentração da época. Cadáveres aos montes, não reclamados por ninguém”, afirmou o professor Benedito Toledo, 68 anos, chefe da anatomia da Universidade Federal Gama Filho, do Rio de Janeiro.
Hoje, com a escassez, certamente será preciso promover cortes profundos nas aulas de dissecação de cadáver. Se necessário, cortes na própria carne.

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Golpes baixos terão resposta à altura.